A segunda demissão na gestão de Temer

maio 31, 2016 0 Por mediai
Pressionado por familiares e amigos e sitiado pelos servidores que não o aceitavam de volta ao cargo, o ministro da Transparência, Fiscalização e Controle, Fabiano Silveira, pediu exoneração do cargo no início da noite de ontem

Redigiu uma carta de demissão justificando a saída, mas preferiu comunicar a decisão ao presidente em exercício, Michel Temer, por telefone. Foi o desfecho de um dia em que os servidores da antiga Controladoria-Geral da União sitiaram o prédio do ministério e exigiram a saída do titular da cadeira, derrubando o segundo ministro de Temer em apenas uma semana.

Menos de 24 horas antes, Fabiano esteve com Temer no Palácio do Jaburu. Sabia que seriam divulgadas conversas nas quais ele, ainda integrante do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), aconselhava o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), sobre como se defender na Procuradoria-Geral da República em relação à Operação Lava-Jato. Também criticava a atuação do procurador-geral, Rodrigo Janot, dizendo que os investigadores estão “perdidos nos trabalhos”.
Fabiano deixou o encontro e afirmou a interlocutores que as próprias explicações dadas ao presidente tinham sido convincentes. Mas a segunda-feira começou e o prédio do ministério foi tomado pelos servidores. Cerca de 250 técnicos e analistas da CGU assinaram duas listas entregando seus cargos em comissão, incluindo 23 chefes das regionais da Controladoria, caso Silveira continuasse ministro.
Das 7h às 11h, os servidores cercaram o prédio e exigiram a saída do ministro. O carro oficial, que estava apenas com o motorista, foi impedido de entrar na garagem. Os auditores entraram no prédio e fizeram uma lavagem simbólica do gabinete ministerial. Também entraram no gabinete do secretário de Federal de Controle, Francisco Bessa, e reforçaram o pedido para que todos os diretores entregassem seus cargos.
À tarde, uma caminhada com “praticamente todos os servidores”, segundo Rudinei, saiu da Controladoria, no Setor de Autarquias Sul até o Palácio do Planalto. Eles pediam a saída do ministro. Buzinaram na Praça dos Três Poderes e, com fogos de artifício e faixas dizendo desejar a CGU de volta, insistiram pela demissão de Fabiano.
Temer não queria tomar a decisão extrema. O presidente em exercício não pretendia melindrar Renan, padrinho de Fabiano. O peemedebista é considerado fundamental na tramitação das propostas de ajuste fiscal no Congresso e, sobretudo, na batalha pela confirmação do impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff, cuja votação está prevista para o início de agosto.
Os ministros e o presidente maquiaram o receio em relação a Renan com o discurso de que “não havia nada demais nas palavras de Fabiano Silveira”. Temer mandou um recado ao presidente do Senado, que voava para Brasília, dizendo que Fabiano permaneceria no cargo. Por volta das 16h, o próprio Temer ligou para o ministro da Transparência, Controladoria e Fiscalização, ratificando que ele continuava como titular da pasta. Mas os servidores intensificaram a pressão.
“Especulações insólitas”
Em coletiva no início da noite, o presidente do Sindicato Nacional dos Analistas e Técnicos de Finanças e Controle (Unacon), Rudinei Marques, acusou Fabiano Silveira de ter “objetivos pouco confessáveis” na atuação. Segundo apurou o Correio, os procuradores da PGR de fato receberam visita de Silveira, quando ele era integrante do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), perguntando pelo andamento dos inquéritos da Lava-Jato.
Rudinei Marques afirmou que as gravações eram “devastadoras” porque expunham como o ministro poderia atuar na CGU ao se deparar com informações que pudessem “comprometer” diversos políticos, de vários partidos, inclusive aquelas obtidas mediante parceria com a Polícia Federal e o Ministério Público nas grandes operações. “Isso para nós é devastador porque temos aqui dentro um volume imenso de informações que comprometem políticos de todas as matizes. A maioria das prefeituras, aliás, é do PMDB. Mas o fato é que as informações e a profundidade dos nossos levantamentos precisam ser preservadas a todo custo”, defendeu Rudinei.
Na carta de demissão, Fabiano agradeceu o convite para ser ministro e reclamou ser vítima de especulações insólitas. Assegurou que em suas palavras “não havia oposição aos trabalhos do Ministério Público ou do Judiciário e sim comentários genéricos, amplificados pelo clima de exasperação política que todos testemunhamos”.
Em nota, Renan disse ontem que não vai “indicar, sugerir, endossar, recomendar e nem mesmo opinar sobre a escolha de autoridades no governo do presidente (interino) Michel Temer”. “A indicação de nomes é incompatível com a independência entre os Poderes da República”, justificou.
“O fato é que as informações e a profundidade dos nossos levantamentos precisam ser preservadas a todo custo” 
Rudinei Marques, presidente do Sindicato Nacional dos Analistas e Técnicos de Finanças e Controle
Memória
Jucá foi o primeiro
Fabiano Silveira, do Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle, é o segundo ministro do governo de Michel Temer que cai, vítima dos grampos do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado. O primeiro foi o ex-todo-poderoso ministro do Planejamento Romero Jucá.
Em ambos os casos, os exonerados criticaram os desdobramentos da Operação Lava-Jato. Jucá, de maneira muito mais enfática, discutiu com Machado mecanismos para tentar barras as investigações. Apontou que uma das soluções seria o impeachment de Dilma Rousseff e a entrada do presidente em exercício, Michel Temer. Isso “estancaria a sangria”.
Jucá convocou uma coletiva. Disse que defendia as investigações, que a “sangria” era econômica, que não havia motivos para deixar a pasta. Sofreu uma tímida manifestação na porta do ministério, uma pressão mais ostensiva de parlamentares do PT quando foi ao Congresso na parte da tarde. Não resistiu nem foi bancado por Temer. Anunciou que tiraria licença, pediu exoneração e passou a ser líder informal do governo no Legislativo.
Fabiano, a exemplo de Jucá, também conversou com Temer quando sua cabeça ficou a prêmio. Saiu otimista do encontro. Não deu coletiva, mas sofreu uma pressão muito mais intensa dos servidores da pasta, que o impediram de entrar no ministério, lavaram a porta do gabinete e entregaram cargos de confiança às centenas como forma de protesto.
Ele também deve voltar para o Congresso. Mas, por não ser senador, a tendência é que retome as atividades de consultor legislativo, que exercia antes de ser indicado para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).